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Macapá, Amapá
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Linha E: uma corrida para a morte

Este é o meu relato sobre o único crime me chocou enquanto repórter policial: a primeira cobertura

Por Carlos Lima, jornalista

Há quase dois anos, divulgo notícias policiais em Macapá. A experiência de escrever a editoria surgiu no pior momento possível. Nos primeiros dias, já havia me dado conta de que a violência alcançou níveis incompreensíveis.

Meus dias de sangue começaram em 2009, fevereiro para ser mais exato. Não pensei que aquilo pudesse me transformar tão rapidamente. O primeiro cadáver foi de um taxista. Até então, eu nunca tinha visto o sangue derramar por um orifício na nuca de um ser humano. Pensei, num primeiro momento, como aquele sapato poderia ser tão insignificante: o sapato que faltava no pé esquerdo da vítima. Estava apenas começando, mas já pensava em pedir as contas do jornal. No dia seguinte com a publicação, percebi que aquele era apenas o prenúncio de uma carreira promissora na editoria. Cheguei àquele lugar isolado às 17h10. Chama-se “Linha E”, um ramal do km 9, da rodovia Duca Serra. Meu coração batia acelerado, e ao mesmo tempo, o ar deixou de existir por uns segundos.

Pensei em voltar e inventar uma desculpa qualquer para o meu editor. Mas, de longe, avistei um ponto vermelho. Bem longe! Lá era o local da desova. Sem sabia ao certo o que significava desova. Ainda não sei como, mas nos aproximamos do ponto: eu e meu parceiro. Percebi que não era apenas um carro comum, vermelho, com rodas, portas e placas e etc. Mas algo ali me deixaria apavorado. Todas aquelas pessoas curiosas apontavam em nossa direção. Talvez diziam: “lá vem a imprensa”.

Desci do carro e vi os olhares enraivados dos homens da farda cinzenta: homens acostumados com achados macabros: pareciam cães... Pensei, antes de mais nada, em ver de uma vez por todas aquilo que o destino resguardou aos meus olhos acovardados. O vento estava forte e o sol incidia com seus últimos raios na linha E. Titubeei diante da mórbida faixa amarela com listas transversais pretas, que isolavam o perímetro ao redor do corpo. Lá estava o ponto vermelho de portas traseiras abertas e a vítima debruçada sobre a janela. Eu mal conseguia ver os cabelos cumpridos, mas sabia que eles escondiam a face da morte. Vinte minutos se passaram até meu coração voltar ao ritmo normal.

Meus colegas jornalistas não hesitaram em buscar as fotos que emplacaria suas manchetes. Nesse momento, ouvi o dever me chamando. Com a mão esquerda na faixa amarela, a direita na máquina e olhar vidrado, me aproximei, abismado. Dalí em diante, achei que aquela hora seria a pior de todas, mas não foi.

O momento da remoção seria a grande revelação. Os cabelos compridos da vítima se banhavam em sangue, escondendo o único buraco na cabeça do pobre homem, que depois descobri que não era tão pobre. Nas mãos da perícia, nada mais ficou de relance. Tudo ficou explícito: o buraco, o sangue, o carro, o pé esquerdo descalço, a morte e todos os vestígios mais da atrocidade.
Aquela foi a minha primeira viagem. Mas para alguém aquele foi a última parada: a última corrida. Vi muitas pessoas em suas últimas paradas, depois disso, e aquele ambiente acabou se tornando parte da minha vida até hoje.

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